Foto: Reprodução
Um estudo detalhado de nove pacientes alemães com Covid-19 indica que o novo coronavírus é transmitido com muita facilidade na fase inicial da doença, quando os sintomas são leves e às vezes nem incluem febre. A análise, que acaba de ser publicada no site da revista científica Nature, reforça a importância de barrar o contato entre pessoas com quaisquer sintomas e a população em geral para retardar o avanço da doença.
O estudo foi coordenado por Christian Drosten, do Charité Universitätsmedizin Berlin, um dos mais importantes hospitais universitários da Europa. Drosten e seus colegas acompanharam os pacientes a partir do fim de janeiro de 2020, quando a primeira onda de casos da Covid-19 foi detectada em Munique. Todos os doentes foram acompanhados no mesmo hospital da cidade, capital do estado da Baviera (sul da Alemanha).
De modo geral, o grupo de pacientes teve manifestações brandas da doença, com sintomas como febre, tosse, dor de cabeça e, mais raramente, sinusite e diarreia. Um deles não manifestou sintoma algum, enquanto dois chegaram a ficar com pneumonia.
Os cientistas conseguiram monitorar regularmente a presença de material genético do vírus, de vírus inteiros e de anticorpos produzidos pelo organismo dos pacientes para tentar neutralizar o invasor. Extraíram amostras do nariz e da garganta (por meio de esfregaços com algodão), do sangue, da urina e das fezes dos doentes.
O resultado principal dessa bateria de análises foi a constatação de que há um pico de produção do vírus no organismo nos primeiros cinco dias de sintomas, com uma concentração do parasita nas vias respiratórias superiores (nariz, garganta etc.). Também havia grande quantidade do vírus em amostras de escarro, o que significa que ele também é capaz de “descer” rumo aos pulmões, conforme indicado pelos casos de pneumonia desencadeados pelo Sars-CoV-2, causador da doença.
Foi possível calcular até a quantidade bruta dos vírus em cada amostra. Um único esfregaço continha, em média, 676 mil cópias do material genético do vírus (composto por RNA, a molécula “prima” do DNA) durante os cinco dias iniciais de manifestação dos sintomas. Nos dias seguintes da doença, esse número caiu para 344 mil cópias do RNA viral. A presença de vírus capazes de infectar outras pessoas só decaiu após o oitavo dia de sintomas.
A análise genética também foi capaz de detectar mutações no vírus quase em tempo real. Em determinado dia, por exemplo, os vírus obtidos a partir de esfregaços da garganta e do escarro de um paciente tinham o mesmo genoma; dias depois, os vírus presentes no escarro mantinham o material genético antigo, enquanto os da garganta já tinham sofrido mutação de uma “letra” química de RNA, o que reforça a ideia de que o vírus estava se multiplicando intensamente nas vias respiratórias superiores (afinal, é nesse processo de multiplicação que as alterações genéticas acabam aparecendo).
Uma possível boa notícia oriunda das análises é que o grupo não conseguiu detectar o Sars-CoV-2 no sangue e na urina dos pacientes alemães, e as fezes, embora contivessem grandes quantidades de material genético viral, não abrigavam a forma do vírus com capacidade de replicação (reprodução). Dos nove pacientes, quatro também tiveram perda temporária do olfato e do paladar, outro efeito relativamente comum da Covid-19, conforme têm mostrado outros relatos.
Além de reforçar a importância do confinamento, os dados trazem indicações importantes para o trabalho dos hospitais e para o desenvolvimento de vacinas. Numa situação em que os sistemas de saúde do mundo ameaçam colapsar, a análise dos pacientes alemães sugere que, no décimo dia após o início dos sintomas, quase não há mais potencial para a transmissão do vírus, o que permitiria a liberação desses pacientes com relativa segurança (desde que não sofram complicações).
Além disso, foi possível acompanhar passo a passo a formação de anticorpos contra o vírus. Metade dos pacientes tinham desenvolvido boa quantidade de anticorpos no sétimo dia após o início da doença, e todos tinham chegado a esse estágio 14 dias após as primeiras febres e episódios de tosse. Não houve correlação clara, entretanto, entre a quantidade de anticorpos e a duração da doença. Em vez disso, os anticorpos levaram a uma diminuição lenta e constante do vírus no organismo.
Portanto, dizem os pesquisadores, seria interessante que uma futura vacina desencadeasse uma produção forte de anticorpos logo de cara para ter eficácia.
Fonte: Folhapress
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